A concessão do Prêmio Nobel da Paz à líder da oposição venezuelana María Corina Machado deveria ter provocado celebrações entusiasmadas entre movimentos feministas e governos que se dizem defensores da democracia e dos direitos das mulheres. Afinal, trata-se de uma mulher que enfrenta, com coragem, uma ditadura marcada pela censura, pela perseguição política e pelo colapso econômico e humanitário de seu país. No entanto, o que se viu foi um silêncio constrangedor.
Nem o governo Lula, partidos de esquerda, nem as principais vozes do feminismo de esquerda no Brasil, manifestaram apoio ou reconhecimento público à conquista de María Corina — uma ausência que revela, mais uma vez, a contradição de um discurso que se diz comprometido com a “sororidade” e com a luta feminina, mas que se cala quando a protagonista não pertence ao campo ideológico “correto”.
A omissão é reveladora. Enquanto o Planalto mantém relações amistosas com o regime de Nicolás Maduro, acusado de crimes contra a humanidade pela ONU, o governo brasileiro evita qualquer gesto que possa ser interpretado como crítica à ditadura venezuelana. O mesmo vale para parte do movimento feminista, que prefere não exaltar uma mulher cuja luta pela liberdade contraria seus alinhamentos partidários.
Como fica, então, a tão propagada “sororidade”? Onde está a solidariedade com uma mulher que desafia um regime autoritário, enfrenta ameaças de prisão e luta para devolver a democracia ao seu país? O silêncio não é apenas incoerente — é cúmplice. Quando a ideologia fala mais alto que os princípios, a defesa dos direitos das mulheres perde sua força moral e se transforma em mero instrumento político.
María Corina Machado não precisou de slogans ou hashtags para provar seu compromisso com a liberdade. Sua vitória no Nobel é uma homenagem à resistência feminina em meio à opressão. Já o silêncio dos que dizem lutar por todas as mulheres é o retrato de uma seletividade vergonhosa: coragem vale apenas quando serve ao discurso.

